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stelladelacerda

Entrevista: Prof. Dra. Inês Duarte (Universidade de Lisboa)


Entrevista publicada no Volume 8 nº 1 (2019) da Revista Eletrónica de Linguística dos Estudantes da Universidade do Porto – Revista elingUP (<https://ojs.letras.up.pt/index.php/elingUP/article/view/6389/5997>).


Inês Duarte é Professora Catedrática do Departamento de Linguística Geral e Românica da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e Investigadora do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, do qual foi diretora entre fevereiro de 2010 e março de 2013. Como áreas de investigação, Inês Duarte tem vindo a desenvolver trabalho em sintaxe comparada, linguística portuguesa e linguística educacional, tendo também como outras áreas de interesse a aquisição da sintaxe e a teoria da gramática.

Licenciada em 1974 em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Inês Duarte conclui o doutoramento, na mesma faculdade, em 1987 com uma dissertação sobre o tema da topicalização em português - A Construção de Topicalização na Gramática do Português: Regência, Ligação e Condições sobre Movimento. É autora de dois capítulos da mais recente Gramática do Português editada pela Fundação Calouste Gulbenkian, tendo feito parte também da equipa editorial da anterior Gramática da Língua Portuguesa publicada pela Editorial Caminho.

A entrevista que se segue foi realizada no dia 29 de março de 2019 no Centro de Linguística da Universidade do Porto. Os temas de conversa foram, sobretudo, aspetos relacionados com a sintaxe, por ser essa a área de especialidade da Professora Inês Duarte. Contudo, tivemos também oportunidade de abordar outros assuntos relacionados com a vertente educacional da linguística, bem como aspetos da própria história da linguística e o seu papel enquanto ciência. Pelo tempo disponibilizado e pela generosidade na resposta às perguntas colocadas, deixamos um enorme agradecimento à Professora Inês Duarte e convidamos todos os leitores a conhecer (melhor) as palavras de uma das mais reconhecidas linguistas portuguesas.


Bom dia. Queremos, antes de mais, agradecer ter aceite o nosso convite. É um prazer enorme estarmos perante uma linguista de renome.

Muito obrigada. É um prazer muito grande voltar ao Porto. Como, provavelmente, sabem eu fui umas das fundadoras do CLUP. Era muito jovem, tinha pouco mais do que a vossa idade e foi uma daquelas aventuras que acabou bem. Posteriormente, fui para Lisboa e decidi que a minha vida teria que ser por lá. Mas guardo sempre uma recordação muito boa desta passagem que durou três ou quatro anos pela Universidade do Porto, numa altura em que estava, praticamente, tudo a começar na Faculdade de Letras e, sobretudo, na linguística. Esta área começou em ’74, ’75 e eu vim para cá em janeiro de ’76 com as professoras Ana Maria Brito e Fátima Oliveira. Portanto, foi uma grande aventura. Para além disso, foi uma aprendizagem muito grande e eu penso que uma parte da minha vida na Faculdade de Letras de Lisboa teve uma marca mais positiva exatamente pela experiência que eu já tinha tido na Universidade do Porto. É um aspeto muito importante não nos limitarmos a um sítio apenas.


No início da sua carreira, trabalhou com Óscar Lopes, que era um linguista com um interesse especial pela semântica. Por isso, como começou o seu interesse pela sintaxe?

Começou muito antes na licenciatura. Eu pertenci ao primeiro curso que estudou gramática generativa em Portugal e éramos um grupo dos melhores alunos: Eduardo Paiva Raposo, Isabel Faria, Ana Maria Brito, Gabriela Matos. Com eles, uma pessoa mais velha, que depois desapareceu, José António Meireles. Nós fizemos Linguística Portuguesa II, que foi a primeira introdução à gramática generativa que houve em Portugal. Esta foi a origem do meu interesse pela gramática generativa, numa altura em que não se falava de semântica. Nos primeiros tempos da gramática generativa e, por razões compreensíveis, algumas questões semânticas estavam completamente arredadas do projeto. Este projeto tinha como principal objetivo encontrar algoritmos que dessem conta daquilo que era uma língua natural: verificar as sequências que eram ou não possíveis, entre outros.

A semântica estava um pouco afastada, porque na altura pensava-se nesta área como semântica lexical. Este tipo de semântica mantém uma relação muito estreita com a cultura e a sociedade. Além disso, é verdade que não tínhamos ferramentas para formalizar as teorias. Em ’56, ’57, quando Chomsky começou com este projeto, na realidade, ele trabalhava basicamente em duas áreas, a sintaxe e a fonologia. Por isso, a minha formação baseia-se em sintaxe, embora tenha feito também alguns seminários de fonologia estrutural.

A linguística estrutural já nos tinha permitido fazer uma fonologia interessante, isto é, dar conta do que são os sistemas fonológicos das línguas. No entanto, ainda não havia isto para a sintaxe. É, exatamente, com a Gramática Generativa que isso começa e é, de facto, aliciante, quando se é conquistado por isso aos 20 anos. O meu contacto com o professor Óscar Lopes enriqueceu-me extraordinariamente, porque me levou a pensar em questões semânticas em que eu nunca tinha pensado. Naquela altura, ele era, provavelmente, a pessoa que sabia mais e que lia mais de Gramática Generativa em Portugal. Era uma pessoa que estava completamente a par do que se passava, só que o interesse dele se baseou na lógica e na matemática, porque talvez não lhe tenham permitido fazer outra coisa. Agora, o que ele deixou em todas as pessoas que colaboraram com ele, e em mim, em particular, para além de um contacto com questões de semântica – em que continuei interessada – foi, sobretudo, aquilo que é a perspetiva de um investigador, de um cientista.

Não é alguém que descreve as coisas, que comenta as coisas, que faz um discurso crítico, não é. É alguém que faz perguntas, são as chamadas perguntas de investigação, procura e usa metodologias consagradas, procura os instrumentos teóricos de que precisa para formular as suas hipóteses, verifica se são ou não infirmadas pelos dados e avança a partir daí. Ou confirma essas hipóteses ou, no caso de as infirmar, volta ao princípio com novas hipóteses – e isso ele ensinou-nos a todos nós. Talvez algumas pessoas tenham aprendido isso para a vida, outras não. Eu, felizmente, acho que aprendi para a vida.


A senhora professora também tem trabalhado na área da aquisição da sintaxe. Na sua opinião, que contributos é que este tipo de trabalho pode trazer para os estudos em linguística teórica e aplicada?

Desde os finais dos anos ’60 que é muito claro, por exemplo, no pensamento de Chomsky, que é necessário que a linguística, como todas as ciências, ultrapasse o nível da adequação descritiva, para encontrar um conjunto de princípios, de axiomas, a partir dos quais conseguimos derivar comportamentos dos falantes. Mas não devemos apenas encontrar generalizações descritivas, mas conseguir, a partir desse conjunto de princípios, fazer predições que nos levem a procurar novos dados e a formular novos problemas. E, para Chomsky, isso é muito claro e aparece num livro que se chama “Knowledge of language”, traduzido para português por Anabela Gonçalves e Ana Teresa Alves sob a minha orientação.

Como estava a referir, para ele é muito claro que atingir a adequação explicativa envolve sabermos como é que, de uma faculdade da linguagem universal, chegamos ao conhecimento adulto de uma língua particular, que é a da sociedade em que estamos inseridos. Estamos, obviamente, a simplificar as coisas. Sabemos – e cada vez mais é verdade – que as sociedades não são monolingues. Ao estudarmos aquisição, conseguimos perceber como é que vai evoluindo essa faculdade da linguagem com que todos nós nascemos e, hoje em dia, dizer isto já não é nenhum postulado filosófico. Sabemos quais são as áreas do cérebro que estão interconectadas para darem conta de vários aspetos do processamento da linguagem.

A faculdade da linguagem é uma capacidade biológica, o que nós, linguistas, estamos a fazer é dar conta de subsistemas mentais cujo “hardware” é neurobiológico. Claro que, aos linguistas, compete estudar a maneira como uma “coisa” que ainda não sabemos caraterizar completamente, mas que tem que ser suficientemente restritiva, consegue evoluir, interagindo com os dados que recebe dos pais, dos pares e da escola e evolui até chegarmos a um determinado conhecimento que depois é relativamente estável. Portanto, o primeiro problema para que procuramos encontrar resposta é esse, tem que ver como nós, na realidade, conseguimos, da faculdade da linguagem, chegar a um sistema tão espetacular, que é algo que nos faz estar aqui a falar e entendermo-nos. Podia ser no Japão, um japonês podia estar a fazer a mesma coisa com outros falantes de japonês. E se o japonês tivesse sido transplantado para Lisboa com um mês de idade e tivesse vivido aqui, era o português que adquiria.

Depois podemos aplicar o conhecimento científico sobre o processo de aquisição, por exemplo, a situações clínicas. Procurando responder a questões como “o que é que acontece quando, em vez de seguir o caminho normal, o processo de desenvolvimento linguístico segue um caminho que não é típico?”, podemos observar crianças com SLI (um certo tipo de atraso que só afeta a linguagem, não afeta a inteligência no geral, nem outras capacidades) ou com patologias do espetro autista. E, quando nós estudamos comportamentos dessas populações, começamos a perceber o que está afetado do ponto de vista do conhecimento linguístico: por exemplo, relativamente à sintaxe, problemas com núcleos funcionais altos na hierarquia da frase ou com movimento sintático em contextos de intervenção. Este conhecimento permite desenhar processos de terapia que minimizem estes problemas ou que acelerem a sua resolução. Mas o que já sabemos sobre aquisição e desenvolvimento deve também ser mobilizado no contexto educativo.

No caso dos comportamentos típicos, o estudo da aquisição devia permitir-nos planear um programa ou um currículo que fosse compatível com aquilo que é a capacidade que as crianças têm de processar e produzir enunciados na sua língua materna. Por exemplo, existem muitos estudos que mostram que, na resolução de problemas matemáticos ao nível do quarto ano de escolaridade, se a instrução do problema for dada com uma frase ativa, há mais crianças a acertarem do que se for dada na passiva com o verbo ser. E se for dada com uma passiva pronominal, do tipo “encheu-se um tanque com”, ainda há menos casos de acerto. Esta informação devia ser dada a todos os professores de matemática, para perceberem, na formação de professores, a importância que isto tem. E um menino no quinto ano de escolaridade tem mais dificuldade em processar passivas do que ativas, sendo as passivas de –se ainda mais complicadas.

É crucial transmitir este tipo de informação aos professores e aos planeadores que definem o currículo. Há uma outra coisa que também é importante, que é o contrário da aquisição: é o estudo da perda linguística, que é o que acontece com os falantes de herança, que começam com uma língua materna falada em casa e depois entram no contexto da escola e da sociedade de acolhimento e vão perdendo a língua materna. Aqui no Norte, há uma pessoa que trabalha sobre isso, que é a nossa melhor especialista nessa área: Cristina Flores, da Universidade do Minho.


A Senhora Professora teve a oportunidade de, dado o período em que iniciou o seu percurso profissional, acompanhar o começo e a consolidação do generativismo. Terá provavelmente acompanhado de perto algumas das reformulações ao modelo teórico inicial dos anos 60. Nesse sentido, gostaria de saber como é que vê e avalia a sintaxe atual.

Essa é uma boa pergunta, é difícil e eu prometo que não demoro muito tempo. Tem sido uma aventura fascinante, pois tem acontecido aquilo que acontece em todas as áreas científicas: temos de nos manter em cima do acontecimento e ir acompanhando aquilo que vai acontecendo e isso é cada vez mais difícil porque, por um lado (e ainda bem!), há cada vez mais pessoas a trabalharem nesta área e, por outro lado, há cada vez mais línguas que estão a ser estudadas dentro da mesma grande perspetiva teórica, se quiserem, da família generativista.

É claro que, ao longo deste tempo todo, há aquilo que se pode chamar mainstream. Todas as ciências têm uma mainstream, mas a própria mainstream generativista evoluiu ao longo do tempo. De uma maneira geral, até pelo menos ao ano 2000 ou, pelo menos, até metade dos anos 90, sempre com o Chomsky a marcar as grandes evoluções, os grandes saltos e a fazer as grandes sínteses depois. No fundo, tudo isto começa em 1955 com a tese de doutoramento dele [de Chomsky], que é muito pouco conhecida, aliás, só foi publicada mais tarde. Portanto, na realidade, o livro que lançou pela primeira vez o programa generativista foi o livro de 1957 de Chomsky, que foi publicado na Europa, na Mouton, intitulado Estruturas Sintáticas.

A passagem das Estruturas Sintáticas para o modelo de 1965, que é o modelo dos Aspects, a chamada Teoria Standard, é já uma evolução absolutamente espantosa. Aparece aqui pela primeira vez o léxico com uma grande importância. Depois disso, é, na minha opinião, em 1981 que se faz a grande síntese e que é uma síntese lindíssima! Pela primeira vez, no mesmo quadro teórico, consegue-se abordar a gramática de uma língua, a aquisição de uma língua e a variação entre línguas. Isso é um avanço absolutamente espantoso. É o primeiro grande momento de unificação na linguística. A partir daí, como já tinha acontecido antes, a família generativista começa a divergir e, neste momento, há muitas teorias a conviver, o que torna mais difícil fazer uma avaliação das melhores análises, pois os pressupostos em que elas se baseiam podem ser muito diferentes. Por exemplo, se vocês compararem a linha do Rizzi atual com o seu ponto de partida, ou se olharem para os pressupostos da nanosintaxe, reparam que há muitas perspetivas em competição dentro, como eu estava a dizer, da chamada família generativista, ou, se preferirem, do programa generativista.

Neste momento, acho que a mainstream, a que apresenta uma formulação mais restritiva da teoria, está do lado dos Estados Unidos. Ora, quanto mais restritiva for uma teoria, tanto melhor, visto que é mais fácil avaliar as suas hipóteses contra os dados empíricos e validá-las ou invalidá-las. Pelo contrário, em teorias pouco restritivas, a avaliação das hipóteses é muito mais difícil, porque a teoria põe ao serviço do investigador instrumentos de enorme poder descritivo. Mas pronto, o presente é desafiante! Não é tão seguro como nos anos 80, em que dispúnhamos de um modelo (o modelo dos Princípios e Parâmetros) espetacular! Mas há coisas que, de facto, esse modelo não permitia captar e, portanto, foi preciso acrescentar-lhe algo ou transformá-lo, o que é o caminho normal na investigação científica.

Na verdade, quando nós estamos dispostos a contribuir na medida das nossas possibilidades, isto é, quando se é verdadeiramente um investigador, tem-se a noção de que aquilo que sabemos e que estamos a dizer hoje e para o qual temos provas, amanhã pode ser desmentido. E continua a ser importante o que fizemos! Mas ainda bem se vierem outros que mostrem que isto não estava bem ou que há uma coisa melhor para dar conta do assunto. Eu acho que isso é a coisa mais importante e um programa, como o programa generativista, permite que nós façamos isso, ao passo que certas abordagens da linguagem humana, que são demasiado abertas e irrestritas, já não o permitem.

Quando nós incluímos, por exemplo, questões sociais e culturais no estudo da língua, podemos fazer descrições, mas não são essas as verdadeiras perguntas de investigação que nos possam levar a uma conclusão consistente sobre o funcionamento da língua. Só conseguimos avançar se fizermos perguntas pequeninas e, normalmente, são essas perguntas pequeninas que dão origem a grandes respostas. Saber como é que a linguagem se relaciona com a sociedade não é uma pergunta de investigação, pois envolve tantas variáveis que não é possível encontrar uma resposta validável.

Não estou com isto a dizer que não há perguntas que se devam fazer sobre a relação entre linguagem e sociedade! Há imensas! Por exemplo, será que a inserção social ou o status social de uma pessoa é uma variável determinante na opção por relativas resuntivas em português europeu? Isto é uma pergunta a que se pode responder e temos aí uma correlação entre sociedade e linguagem, através de conceitos como o de desempenho linguístico. É, aliás ainda, uma pergunta muito grande porque, dentro de uma sociedade, podemos pensar no status em geral ou, por exemplo, apenas no que respeita ao nível de escolaridade. Isto são perguntas a que se consegue responder, dando contributos para essa tal magna questão que é a da relação entre a linguagem e a sociedade.

Eu acho que quem quer fazer linguística tem de perceber isto. Há um discurso sobre a linguagem que não é ciência. Que é legítimo, absolutamente legítimo, mas que não é ciência, no sentido em que não tem como base perguntas de investigação, isto é, perguntas a que se possa responder com provas, com provas replicáveis por outras pessoas. Ora, é isso que faz a ciência, não é?


Chegada a esta fase da sua vida profissional, com uma carreira dedicada à ciência em geral e à sintaxe em particular, o que é que considera mais importante no estudo desta área científica?

Bem... vou dar o exemplo da física. Hoje em dia, nenhum físico pode dizer que é newtoniano e que não acredita na teoria da relatividade, isto é, que é pré-einsteiniano. Toda a comunidade dos físicos sabe que há uma data de fenómenos que a física newtoniana não consegue captar e, portanto, hoje em dia ninguém faz carreira na física se disser “eu não acredito em nada da física do século XX, eu continuo newtoniano”. Isso é impossível numa ciência dura como a física.

O que eu acho que acontece nas ciências ditas moles, nas ciências sociais, é que há mais possibilidade de as pessoas optarem por uns modelos ou por outros, é algo, por enquanto, mais aceitável e que continua a acontecer.

Agora, quando nós olhamos para as grandes revistas e para as grandes coleções das grandes editoras, o que verificamos é que essas revistas são ou de semântica formal, ou de linguística formal ou de aquisição da linguagem em perspetivas amplamente generativistas. Podem ser ainda revistas de fonética - e essas levantam outra questão que, no fundo, se trata de uma relação muito direta com a física, com a psicologia e com os estudos percetivos - ou de psicolinguística, numa perspetiva de interação entre as neurociências, a psicologia cognitiva e a linguística. Depois ainda aparece aquela etiqueta “linguística da cognição”, que corresponde às tais grandes perguntas: “onde é que a cultura e a sociedade influenciam a linguagem?”, por exemplo.

Uma outra área que tem sido trabalhada de várias maneiras é a da tipologia linguística, que realiza, no fundo, uma comparação entre línguas. Mas, mesmo aí, o trabalho mais interessante, na minha perspetiva, é o que está a ser feito por pessoas que se situam, de uma maneira mais ou menos abrangente, dentro do programa generativista. Pessoas como Michel DeGraff, por exemplo, que trabalha no MIT sobre o crioulo do Haiti e cuja investigação é fundamental para se perceber como é que nasce um crioulo e o que são, afinal, as chamadas “línguas neocoloniais”, como o português em África e o inglês da Índia. Neste momento, há muita gente que, numa perspetiva generativista, está a olhar para essas questões como o resultado do contacto entre línguas e como produto desse mesmo contacto, isto é, a aquisição de uma língua que não é materna, uma língua segunda ou estrangeira.

Eu acho que, até agora, do ponto de vista daquilo que a gente tem aprendido sobre o que é a linguagem, o programa generativista, num sentido muito alargado, tem dado as melhores respostas. E, nesse programa, a centralidade é da sintaxe e é-o de uma maneira muito clara, de uma maneira que eu acho que é exatamente aquilo que faz sentido. Se o que caracteriza uma língua é, digamos assim, uma relação estável entre som e significado, o que é que faz a mediação? Por um lado, as propriedades das palavras e, por outro lado, o sistema que permite que elas se combinem umas com as outras.

Ora, isso é a sintaxe! De uma maneira geral, a arquitetura é a sintaxe, é aquilo a que Chomsky chama, nos últimos trabalhos, “o sistema computacional da linguagem humana”. A sintaxe é a arquitetura de toda a língua, não só os alicerces, mas toda a planta. São perguntas como: “como é que eu vou juntar isto com aquilo para fazer a sala?”, “se tenho dois andares, como é que tenho que construir os alicerces?”, “se vou fazer um terraço lá em cima, o que é que preciso como cobertura?”. É isso, estão a ver, é um lego!


Tendo trabalhado com tantos e tão variados tópicos da sintaxe - como o sujeito nulo no português, as várias orações relativas, a questão do infinitivo flexionado, mas também o denso assunto da topicalização - que aspeto é atualmente o que lhe desperta maior interesse?

As últimas coisas em que eu tenho trabalhado – e vou continuar a trabalhar em algumas delas, em particular na última de que vou falar – foram questões de controlo e infinitivo flexionado. A aula1 que eu vou dar hoje é uma aula que resulta exatamente do trabalho que foi desenvolvido num projeto dirigido pela Ana Lúcia Santos. Um projeto financiado pelo FCT, justamente sobre questões de controlo e infinitivo flexionado em Português Europeu, tanto na sintaxe adulta, como na aquisição, e que deu várias publicações. Já tinha trabalhado nisso antes, porque é uma área que, digamos assim, é aquele tópico a que eu volto sempre desde jovem. Já tinha trabalhado nos clíticos, é muito engraçado!

O primeiro artigo publicado em sintaxe generativa em Portugal foi um trabalho meu de 1983 sobre os clíticos em português europeu e brasileiro, mais concretamente, a ordem dos clíticos. E a minha tese de doutoramento foi também a primeira tese de doutoramento em sintaxe generativa em Portugal, em 1987. Os clíticos são o tópico que mais me desafiou ao longo da minha vida profissional. A última vez que trabalhei sobre clíticos foi em 2013. Portanto, estão a ver, de 1983 a 2013, tenho voltado a este assunto e talvez vá continuar. Não sei se foi o tópico para o qual eu contribuí mais, mas acho que contribuí alguma coisa! Aquilo que não me interessa de todo e que eu nunca soube trabalhar, nem nunca me despertou interesse, foi o sintagma nominal ou o sintagma determinante. Admiro muito a professora Ana Maria Brito por ter trabalhado tanto nesse tópico. Tenho a maior dificuldade em lidar com a estrutura interna do sintagma nominal, portanto, isso é uma coisa a que tenho fugido. De resto, eu acho que me interessa tudo aquilo que é a nível frásico.

Agora, tenho trabalhado num projeto novo em que vão participar os professores Ana Maria Brito e António Leal aqui do CLUP. É um projeto que nós ganhamos há pouco tempo e que começou agora, em outubro ou em novembro, chamado PALMA. É um projeto sobre as relações de posse e de localização em português europeu e em variedades africanas nativizadas ou em processo de nativização do português. Portanto, vamos olhar para o português de São Tomé, que está praticamente nativizado. Mais ou menos noventa e oito por cento (98%) dos são-tomenses têm o português como língua materna.

Em Angola, mais de setenta por cento (70%) dos falantes têm o português como L1 e, em Moçambique, os dados do último censo apontam para um número superior a 50% de falantes com o português como L1 ou L2. Aquilo em que eu tenho trabalhado é em dativos de posse. Aliás, fiz um trabalho recentemente com a professora Fátima Oliveira sobre esse tema: dativos de posse e estruturas chamadas de “subida do possessivo” (“possessive raising”), que são estruturas engraçadíssimas. Agora, é comparar isso com as línguas bantu, com aquilo que se passa em Angola e Moçambique, como, eventualmente, resultado do contacto entre as línguas bantu e o português, tendo em conta que as línguas bantu faladas em Angola têm estruturas de posse bastante diferentes das línguas bantu faladas em Moçambique. Portanto, vou andar pela posse e pela localização durante mais três anos.



E já agora, qual é o constituinte sintático que mais a fascinou? Disse que o sintagma nominal era o que menos lhe despertava o interesse. Tem algum preferido?

Para as pessoas que trabalham em sintaxe, acho eu, a partir de uma certa altura, os seus grandes objetos de estudo são os núcleos funcionais. Consoante o tipo de fenómeno que estamos a trabalhar, privilegiamos um ou outro. Aquilo que eu acho mais importante é trabalhar minimamente os núcleos funcionais, como T e C, em função do fenómeno empírico com que se está a lidar.


Senhora Professora, há uma frase muito interessante do Paul Valéry que diz “A sintaxe é uma faculdade da alma”. O que é que pensa desta frase?

Se “alma” significar “mente”, então a linguagem humana é uma faculdade da alma, não é? Eu dizia isso muitas vezes aos meus alunos. Sócrates, se fosse vivo na segunda metade do século XX, era linguista. É claro que eu, hoje em dia, não seria capaz de dizer exatamente essa frase como Paul Valéry disse. Mas diria o que vários cientistas da cognição têm dito, que, no fundo, o que se passa é que o desempenho linguístico dos seres humanos é uma janela aberta sobre o funcionamento da nossa mente. E a sintaxe, acreditando que ela faz a mediação entre o som e o significado, é crucial para nos dar uma visão do que é a nossa mente e do que se passa nela.


Também foi diretora do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa. Que balanço faz dessa experiência? Qual o papel que os centros de investigação em linguística devem ter na sociedade portuguesa?

Foi um grande desafio, porque o Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, tal como existe neste momento, resultou da fusão do antigo Centro de Linguística, que tinha sido o Centro dos Estudos Filológicos, com uma unidade que foi criada dentro da Faculdade de Letras e que envolvia as pessoas que não pertenciam ao Centro de Linguística antigo. Foi na altura em que eu fui vice-reitora que desafiei as pessoas envolvidas nas direções dessas duas unidades a juntarem-se e a fazerem um centro só e isso foi fundamental para todos nós.

A experiência de direção do novo CLUL, pouco depois da fusão, não foi fácil! Não foi fácil por várias razões. Muitas delas tinham a ver com questões completamente independentes dos investigadores ou do trabalho que se fazia. Por exemplo: nós tínhamos duas sedes, metade dos investigadores trabalhava num sítio e a outra metade trabalhava no outro. A pessoa que geria os servidores não era a mesma de um lado e do outro. Foi preciso resolver problemas muito complicados, numa altura também muito complicada, em que se estava a preparar a fusão das duas universidades, da Universidade Técnica e da antiga Universidade de Lisboa. Portanto, foi um tempo complicado, mas foi um tempo desafiante! E acho que conseguimos, mas não fui eu sozinha, longe de mim! Nós temos uma estrutura de direção de três pessoas, mas depois temos uma comissão coordenadora, que tem os diretores de cada um dos grupos.

Aquilo que nós conseguimos durante esses três anos em que estive na direção foi conseguido exatamente pela comissão coordenadora, que se reunia mais regularmente, e pela comissão científica, que se reunia para tomar as grandes decisões. E eu acho que, quando saímos, deixámos o centro numa situação bastante mais forte do que aquela que tínhamos encontrado. Deixámos uma excelente comissão de acompanhamento, que levou muito a sério o trabalho, que nos apoiou a cem por cento: Anthony Kroch, Christiane Feldman, Nina Hyams, entre outros elementos igualmente importantes. Para mim foi fantástico, porque fiquei a conhecer o que se passava e qual a investigação que era feita pelos vários grupos. Só posso agradecer a todos aqueles com quem trabalhei nessa altura.

Relativamente à última parte da pergunta, nós devíamos ser mais visíveis do que somos. Já somos mais, mesmo assim, do que éramos, felizmente, mas devíamos ser mais visíveis, tanto na área da língua como da clínica, da terapia, das ciências da saúde. Mas isso consegue-se devagarinho. Consegue-se convencendo os colegas da psicologia cognitiva de que isso é importante, os colegas da medicina, os neurologistas, os psicólogos clínicos da área da psicologia e da psiquiatria. Convencendo-os de que a nossa contribuição é importante. Consegue-se, convencendo o pessoal da linguística computacional de que esta área precisa de linguistas, senão nunca mais ultrapassam aqueles oitenta e dois ou oitenta e cinco por cento de acerto nas coisas que fazem e, sobretudo, não conseguem compreender melhor aquilo que nós fazemos.

Portanto, é isso que nós estamos tentando fazer e temos tentado fazer em Lisboa. Temos doutoramentos em conjunto com a psicologia, medicina e ciências. Temos doutoramentos em conjunto com Medicina, Letras e o Técnico. Queremos ligar também à tradução, que é uma área importantíssima, e nós temos, neste momento, o nosso mestrado em tradução, no qual há a possibilidade de os alunos fazerem estágio em empresas e em instituições. Estamos também ligados a uma grande empresa, na área da tradução, mas com uma forte componente computacional. Eu acho que é devagarinho que nós conseguimos. Mas também olhamos para áreas que estão a desaparecer: a área da crítica textual, por exemplo, que é o update daquilo que era, em grande medida, a filologia.

É uma dimensão muito importante daquilo que era a filologia e que, neste momento, está a dar muito bons resultados em Letras, com a edição crítica de Fernando Pessoa, como sabem, mas também de escritores do século XIX, como Camilo. É feita com uma metodologia que, na realidade, é uma metodologia nova. Ou seja, no fundo, é não prescindir daquilo em que nós éramos bons e que foi a matriz da linguística. Um outro exemplo: a dialetologia. Hoje em dia, há uma dialetologia com uma metodologia quantitativa importantíssima e há uma dialetologia que, no fundo, é dialetométrica, e de que eu não sei nada, mas que é possível fazer no programa generativista de uma forma muito interessante. No fundo, é um tipo de variação e, portanto, é não perder aquilo que era a nossa matriz inicial, mas, ao mesmo tempo, devagarinho, ir demonstrando que a nossa contribuição é muito importante numa série de outras áreas.


E como é que descreve a realidade da investigação em linguística atualmente em Portugal?

Não tem comparação com aquilo que acontecia quando eu era estudante. Quando eu era estudante, havia um Centro de Estudos Filológicos. Suponho que havia em Coimbra algumas pessoas que estavam a investigar, mas não sei se tinham um centro de investigação, nem imagino. O trabalho destinado para os linguistas era dar aulas ao ensino básico e secundário; muito poucos conseguiam um lugar nas faculdades. Hoje em dia, isto tudo mudou completamente.

Nós temos linguistas a trabalhar em empresas de tradução, por exemplo, muitos deles formados por nós lá em Lisboa, mas muitos formados também por outras universidades. Temos excelentes linguistas portugueses que foram para o estrangeiro, tendo alguns ficado por lá. Temos redes internacionais em que estamos envolvidos e somos chamados como reviewers de grandes revistas linguísticas, de coleções internacionais de editoras de referência, concursos internacionais para universidades, entre muitos outros.

Portanto, há muito lugar para os jovens linguistas hoje em dia. Há uma coisa que eu acho que os jovens linguistas devem fazer: não fiquem sempre no mesmo sítio, abram as cabeças! E abrir as cabeças é mudar de sítio pelo menos uma vez na vida. Tentem ir lá para fora, tentem ter bolsas para ir lá para fora! Mesmo que seja por curto espaço de tempo. Isso é uma aprendizagem que eu, infelizmente, não tive: aquilo que fiz foi já depois de estar formada e de ter o doutoramento. Mas isso é fundamental. Nós crescemos imenso quando ouvimos outras vozes, quando estamos noutros contextos. Isto é uma coisa que eu costumo dizer aos meus alunos, também na Faculdade de Letras: têm de sair e ter contacto com outras pessoas. Foram raríssimos os meus alunos de doutoramento que não tiveram coorientador fora da Faculdade de Letras, porque isso é fundamental. Foram um semestre para a universidade desse orientador, trabalharam com esse orientador. Isso dá uma perspetiva completamente diferente.

E se há alguma coisa que eu possa sugerir aos jovens linguistas que façam é essa. Arrisquem! Procurem uma experiência fora daqui. Eu não gosto muito de usar esta palavra, porque ela foi usada num contexto muito difícil da nossa vida nacional, para levar os nossos melhores jovens, mais qualificados a emigrarem, mas não é de emigração que eu estou a falar. É de formação. Arrisquem sair da vossa zona de conforto: é um mundo pequeno onde nós estamos habituados a viver. Arrisquem! Tenham todas as experiências que puderem, para que o vosso mundo fique maior, porque isso vai refletir-se em tudo. Na vossa qualidade profissional e na vossa experiência como seres humanos!


Ao longo da sua carreira, esteve sempre preocupada com o ensino do português nas escolas. Considera que deveria haver uma intervenção maior por parte dos linguistas na forma como o português é ensinado nas escolas? Neste momento, o que acha que pode ser melhorado neste campo?

Há vários problemas muito grandes relativamente ao ensino do português. Um deles é que não há continuidade de políticas. Quando esta existiu, foi quebrada no governo anterior e agora estão a tentar refazê-la de uma maneira que, se calhar, é apressada. Eu estive muito afastada disso nos últimos anos, porque preferi voltar para a linguística teórica a cem por cento, mas pertenci ao grupo na faculdade que fez a avaliação de manuais do secundário na área do português.

Fiquei aterrada com a ignorância, relativamente a aspetos centrais da língua portuguesa, que emerge desses manuais, assim como com a simplificação dos exercícios que são propostos, uma vez que são propostas atividades completamente estupidificantes. Por exemplo, para um miúdo que está a fazer biologia, aquelas atividades do português que lhe são propostas são básicas, não há nada desafiante! Não são abordados certos aspetos que nós sabemos que são fundamentais e, no fundo, os alunos não são postos a pensar sobre como esses temas funcionam efetivamente, como aconteceria noutras disciplinas. E depois há asneiras de todo o tamanho – asneiras que revelam ignorância por parte de quem faz os manuais e pouca atenção dos revisores científicos.

Nós demo-nos um bocado mal, porque tivemos algumas editoras muito desiludidas com os nossos pareceres, embora ache que, no fim, os manuais ficaram melhores. Agora, essa estupidificação das atividades só mostra que, na realidade, quem faz os manuais tem uma formação linguística fraquíssima e, portanto, não é capaz de construir atividades que sejam significativas e que tenham interesse. Por exemplo (eu acho que é muito fácil chegar lá desta maneira), quase todos os miúdos têm inglês, por isso, mostrem-lhes paradigmas do português e do inglês, mostrem-lhes diferenças na ordem de palavras em declarativas em contextos diferentes: porque será que nesta frase o sujeito está em posição pré-verbal e naquela está em posição pós-verbal? Será que tem que ver com o contexto? Então, se tem que ver com o contexto, qual será o valor que este tem nesta posição e naquela? Na realidade, eu acho que tem que haver um acordo de regime sobre isto. Esse acordo tem de ter em conta que há uma ciência que nos ensina coisas interessantes sobre a linguagem e sobre as línguas, portanto, isso tem de ser passado aos alunos.

Não é porque nós falamos Português que temos que assumir que as pessoas o sabem obrigatoriamente. Também respiramos todos, no entanto, os estudantes têm de aprender o funcionamento do sistema respiratório, todos comemos e deglutimos e eles também têm de aprender o funcionamento do sistema digestivo. Não percebo porque é que não é assim com a linguagem humana, que é tão importante e tão central. Por isso, é preciso um pacto de regime sobre o que é o português na escola, para não haver alterações de cada vez que muda a orientação política. É preciso que as pessoas se sentem à volta de uma mesa e que percebam o que é que a ciência já mostrou sobre a linguagem, a língua materna em particular, mas também as outras línguas. Porque é que nós não usamos esta coisa fantástica que temos, que é, desde muito cedo, haver uma língua estrangeira no ensino, para fazer comparações? É importantíssimo!


Ao longo dos anos, contribuiu para a formação de vários estudantes, tendo alguns deles seguido uma carreira relacionada com a linguística. Sente-se de alguma forma realizada com o papel que teve nestes percursos formativos?

Sim, acho que uma das melhores coisas que nós levamos quando acabamos uma carreira docente é exatamente ter a sensação de que contribuímos um pouco, pelo menos, para que outras pessoas possam levar mais longe aquilo que nós fizemos. Desse ponto de vista, eu fui uma privilegiada, porque a maior parte dos professores de sintaxe do Departamento de Linguística da Universidade de Lisboa foram meus alunos de doutoramento e alguns de mestrado, uma delas é professora catedrática neste momento, outra é professora associada.

A minha primeira aluna de doutoramento foi a professora Perpétua Gonçalves, que é uma figura incontornável na investigação sobre o português em Moçambique. É a sensação de que aquilo que nós sabemos foi posto a render e, de alguma maneira, tocou e contribuiu para que outras pessoas possam ser linguistas e melhores linguistas do que eu fui. É um bocadinho “a cereja em cima do bolo” de qualquer professor. No caso de um professor do ensino superior, é ver que os seus estudantes, sobretudo os da formação avançada, conseguiram ir longíssimo. O que é importante é isso, é sentirmos que a geração seguinte ou as outras gerações hão de ir mais longe do que nós fomos e sentir que nós tivemos um bocadinho que ver com isso.


Que conselhos pode deixar a estudantes que queiram seguir uma carreira em linguística?

Aventurem-se! Parece duro ao princípio. É uma coisa completamente nova, porque vocês vêm do secundário sem ter a mínima ideia do que é verdadeiramente a linguística, porque normalmente vêm de um ensino em que a realidade do trabalho científico não existe. Vocês não têm disciplinas que vos obriguem a perceber o que é investigar no sentido científico. E depois, muitas vezes, chegam à faculdade e afastam-se, porque há uma outra forma de pensar as coisas, há uma terminologia que vocês não conhecem e muita da bibliografia é em inglês. Tudo isto afasta as pessoas.

Sintam-se desafiados, porque vão aprender coisas com as quais podem construir conhecimento futuro, coisas que são uma novidade absoluta para vocês. Dá trabalho: uma tese de doutoramento em linguística é um trabalho muito duro. Mas vale a pena, porque nós, quando chegamos ao fim, percebemos que aprendemos imenso. Há momentos muito difíceis, em que nos sentimos bloqueados. No entanto, há também aquele momento em que, não sabendo como, se dá o clique e, de repente, descobrimos o que faltava. Isso é uma experiência maravilhosa. Quando fazemos discurso crítico ou interpretativo, temos outro tipo de prazer, que não o prazer da descoberta científica.

A linguística dá-nos o prazer da descoberta científica, mesmo que não tenhamos sido nós a fazê-la. É poder vivenciar esse prazer quando lemos o que os outros escrevem e perceber que, um dia, podemos lá chegar também, se nos esforçarmos. Isso é uma coisa que todos os cientistas sentem, um momento de criatividade incrível. Por termos de seguir metodologias e protocolos rígidos, a criatividade entra de uma maneira ainda mais fulgurante. As pessoas podem pensar que os cientistas não têm criatividade, mas não! Se um cientista não tiver criatividade, não é cientista.

Acho que vale a pena ousarmos trilhar um caminho que é duro, mas que nos pode levar a esse prazer da descoberta científica. Sabemos que as descobertas científicas têm resultados práticos. Infelizmente, às vezes, são maus resultados, mas a ciência não é responsável por isso. Por outro lado, há muito bons resultados práticos: atualmente, estamos a ver isso na linguística clínica, no apoio à tradução, em certas áreas da linguística computacional e também em relação à educação. Não desistam, mantenham as vossas cabeças abertas e lutem pelo prazer da descoberta científica.


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Agradecemos à Revista elingUP pela gentileza e disponibilidade em sua parceria com o Linguisticamente Falando.


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1No dia 29 de março de 2019, a Professora Inês Duarte deu uma aula sobre completivas infinitivas na unidade curricular Temas de Sintaxe II do Mestrado em Linguística da Faculdade de Letras da Universidade do Porto.

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